A inconstância do “novo normal”
A inconstância do “novo normal”

A inconstância do “novo normal”

Em tempos incertos é preciso repensar todos os dias como se manter relevante no mercado e se reinventar diariamente

por Juliana Bianchi

Na década de 1990, o filósofo polonês Zygmunt Bauman já falava em um mundo pós-moderno fluído, líquido, como cravou nos títulos de inúmeros livros de sucesso. “A mudança é a única coisa permanente e a incerteza, a única certeza”, dizia ele. Seus estudos nem passavam perto dos efeitos que uma pandemia como a que estamos vivendo teria sobre a sociedade, mas a ideia de impermanência nunca se fez tão presente quanto agora. Assim como a necessidade de adaptação rápida e constante para sobreviver – tanto nós, quanto nossos negócios – em meio uma imprevisibilidade que se impõem, por tempo indeterminado.

“Durante esse período, o conceito de planejamento precisa ser redefinido. Um planejamento de curto prazo é para um ou dois dias. De médio prazo, para três, quatro dias. E de longo prazo para uma semana. Você precisa, basicamente, repensar todos os dias quem você é e como se manter relevante no mercado”, afirmou Carlos Ferreirinha, dono da MCF Consultoria, durante o Foodpass Summit 2020.

A tarefa parece exaustiva. E é. Mas é também a única forma de sobrevivência. Ater-se aos protocolos de segurança, com respeito ao distanciamento social, uso de máscaras faciais e muito álcool gel já não são diferenciais. São necessidades básicas, assim como o serviço de delivery, que todo cliente espera encontrar em qualquer tipo de negócio daqui para frente. Sim, ele não retomará aos patamares anteriores.

Para se diferenciar e surpreender, será preciso ir além. Seja na experiência que se entrega na casa do cliente, o que inclui do atendimento impecável nas redes sociais à qualidade da embalagem, até a quebra de resistências pessoais para a criação constante de novos produtos e serviços.

A criação de uma linha de tortas e bolos de festa menores está ajudando nas vendas da confeitaria Doce de Laura. Divulgação/ Doce de Laura

“A pandemia tirou o contexto das pessoas. Tirou os marcadores de tempo, a ideia de futuro, as justificativas para compras e saídas. É preciso reinventar ou criar esses contextos. Entender o que elas valorizam agora. Quais são os marcadores possíveis a cada momento”, explica Rebeca de Moraes, sócia-fundadora e head da consultoria de tendências Trop.Soledad.

Daí o sucesso que kits festa, caixas com quitutes juninos e cestas de happy hour têm feito. Assim como a criação de porções menores, para atender pequenos grupos em isolamento, como fez Laura Estima, proprietária da Doce de Laura, na Vila Madalena, em São Paulo.

“Antes, só tínhamos tortas doces e salgadas para oito pessoas. Agora criamos um tamanho que serve de três a quatro. Além de bolos de aniversário de 500 g. Isso está fazendo toda a diferença nas vendas”, diz ela, que com isso (entre outras ações, como o deslocamento da vitrine para a varanda) viu sua base de clientes crescer 25% durante a crise, e as vendas do varejo se equipararem à do ano anterior.

BOLOS RESSIGNIFICADOS

Conhecido por seus elaborados bolos de casamento para a alta sociedade, Nelson Pantano, da marca The King Cake, foi outro que precisou adaptar seus produtos. Depois de passar a fazer minibolos decorados para aniversários virtuais, ele lançou recentemente uma linha de bolos para sobremesa batizada “Patisserie Cakes”, com três opções de tamanho: 1,5 kg, 2,5 kg e 3,1 kg. “O foco agora é sobreviver, um mês de cada vez. Negociamos tudo. O importante é não deixar o cliente fugir. Estávamos acomodados, tudo fluía naturalmente. Estamos tendo de voltar à essência como artesãos e inventar algo novo toda hora”, diz o confeiteiro.

No momento, ele tenta surfar na ressignificação do bolo como símbolo de carinho e não apenas de comemoração. Até porque, mesmo quando voltarem, as festas já não deverão ser mais as mesmas.

“Por um bom tempo não devemos ter casamentos grandes, com 500, 1000 convidados. As pessoas voltarão a se reunir em grupos e ambientes controlados, onde todos compartilham dos mesmos marcadores de assepsia no dia a dia, para que todos se sintam seguros no seu clubinho mais próximo”, analisa Rebeca.

Esses grupos, entretanto, não são os mesmos que estão saindo agora e se aglomerando em bares, em busca da vida como se conhecia antes, movimento que ela chama de checagem de estabilidade. Mas de grupos que acreditam que o fato de viverem em ambientes seguros funciona quase como uma vacina contra o vírus.

Nelson aposta no advento de uma vacina verdadeira ou medicamento eficaz para que, então, os eventos possam retornar com força, “mas com o dobro de precaução com a higiene. Não acredito que as pessoas ainda queiram exposição de comida. Os doces já deverão estar em caixinhas, por exemplo”, afirma.

Mas que não se pense que a frugalidade imposta pelos dias de isolamento, que fez muita gente voltar aos básicos, valorizar a “comfort food” e acreditar que se pode viver com menos, reinará para sempre. “A ostentação das grandes festas deve voltar. Cada vez mais a experiência será valorizada. A começar pelos restaurantes, que ficarão mais caros e restritos a uma classe que poderá pagar por esse privilégio. As altas confeitaria e gastronomia não correm risco de desaparecer, mas serão ainda mais para poucos”, observa a consultora da Trop.Soledad.


A nova linha da confeitaria Dama conta com bases de tortas, kits de massa folhada, discos de pão-de-ló, pâte choux e recheios para os clientes montarem seus doces em casa. Foto Helena Mazza

SERVIÇO REMODELADO

Uma das apostas dos grandes players do mundo da restauração alimentar é a evolução do delivery e da experiência que ele pode proporcionar. “É errado entender o delivery como um plug-in para expandir o serviço de salão para a casa do cliente. Ele é outro negócio, que precisa ser pensado desde o começo de forma diferente: do insumo e a apresentação, à embalagem. A experiência em casa não precisa ser motivada pelo preço ou pela conveniência. Há um público disposto a pagar mais para ter algo elaborado, customizado, com maior envolvimento”, afirmou Ricardo Garrido, sócio da Cia Tradicional de Comércio (leia-se bares Original, Pirajá, Astor, Bráz e Lanchonete da Cidade), durante o Foodpass Summit 2020.

A ver a experiência lançada pela confeiteira Nathália Gonçalves, do Charco, na qual o cliente era incentivado a montar a sobremesa em casa, como se estivesse no restaurante . A nova linha da confeitaria Dama, “Dama com seu Toque”, que disponibiliza bases de tortas, kits de massa folhada, discos de pão-de-ló, pâte choux e recheios para os clientes montarem seus doces do jeitinho que quiserem. E o sucesso do trio de sobremesas do restaurante A Casa do Porco, o caminho não é mero devaneio, mas uma possibilidade real a ser testada.

Sem fórmulas prontas, o momento pede justamente isso: muita tentativa e erro, criatividade e reavaliação constante. O que é certo agora, amanhã pode não ser mais. Lembrem-se do Bauman.


Nascida durante a pandemia, a Pudim Terapia fez, em menos de três meses, muito mais pela marca do que muita confeiteira que patina a encarar seu negócio de frente. Foto: Divulgação Pudim Terapia

OPORTUNIDADES À VISTA

Enquanto muitas casas ainda estudam quando e se será possível reabrir em segurança frente o desafio de equilibrar altos custos fixo com a perspectiva de público reduzido no salão, outras já se lançaram à ação. Caso da própria Doce de Laura, que adaptou a antiga garagem para ter mais espaço para algumas poucas mesinhas com distanciamento seguro; da confeitaria da chef Carole Crema; e do café Da Feira ao Baile, em Pinheiros (a unidade do Jardins permanece fechada).

Mas, em meio ao caos, há quem floresça. Alguns pequenos negócios ou que sequer haviam nascido quando a crise chegou se veem decolando de uma hora para outra. “A pandemia colocou todo mundo, ao mesmo tempo, no mesmo nível de ressignificação e perda de controle”, lembrou Ferreirinha. O que deu certa vantagem a quem não tinha muito a perder e soube trabalhar corretamente com a internet – onde o mundo se refugiou em busca da conexão e do afeto perdidos, e teve agilidade para readequar a oferta.

Pontos para pequenos empreendedores, como Gabi Miranda, que foi do primeiro teste na cozinha à venda de 30 pudins por fim de semana, em apenas três meses. Nesse período, ela criou a marca Pudim Terapia, desenvolveu fornecedores, logotipo, embalagem personalizada e público nas redes sociais, contratou uma funcionária, ganhou uma vitrine refrigerada e sonha com a loja física para assim que a pandemia passar.

“Comecei a fazer pudins como terapia e mandar de presente para os amigos. Os elogios foram tantos que vi ali uma oportunidade de negócio”, conta confeiteira recém-descoberta.

Dona de uma agência de marketing digital, ela garante que 50% de seu faturamento mensal já vem dos pudins. “É uma loucura. As pessoas compram para mandar de presente e foi criando uma onda de carinho, um presenteando o outro, que não deve acabar.”

Tassi Oliveira, da Doces da Tassi, de Volta Redonda (RJ), foi outra que soube tirar proveito dos baixos custos, das redes sociais e da necessidade de troca de afeto por meio dos doces para dobrar os lucros. “Tomei coragem para aparecer mais nas redes e mostrar o processo de produção, disponibilizei o cardápio on-line para agilizar os atendimentos e otimizei o processo para os contatos. Veio muita gente nova com isso”, diz ela, que fez dos minibolos, antes destinados a mesversários, seu carro-chefe na quarentena.

Trabalhos genuínos, empáticos e transparentes, onde o contato direto entre quem faz e o cliente fazem toda diferença. Valores que as grandes marcas estão correndo atrás para alavancar e fidelizar vendas, e que certamente perdurarão nesse novo normal. Ainda que muita coisa ainda possa mudar. Afinal, nada é permanente exceto a mudança, como já dizia Heráclito, em 540 a.C.

 

Crédito foto capa: Divulgação/ The King Cake
Leg: Bolo de amêndoas com baunilha e morango da nova linha de sobremesas “Patisserie Cakes”, do ateliê The King Cake, especializado em bolos decorados para festas e casamentos. Inovação durante a pandemia.

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