A polêmica da bengalinha
A polêmica da bengalinha

A polêmica da bengalinha

Você sabe o que é bala dura? Tem segredo? Tem polêmica? Tem, claro que tem!

por Lucas Mota

Então é Natal… E cá estamos nós meus mancebos, tentando manter tradição numa época completamente não tradicional.

Esse mês foi difícil sentar pra escrever meu texto para o Sobremesah. Primeiro porque acho que meu ultimo texto ficou tão bom que deveria ser meu último!! Segundo, porque faltava um assunto pra fisgar minha curiosidade… Mas, eu fiz um compromisso com você, você mesmo que está lendo, quando aceitei esse convite de participar do Sobremesah. Então, fui buscar algo para apresentar a você, fechando com chave-de-ouro esse ano-de-bosta. (palavrões estão permitidos no fechamento do ano!)

Durante todo ano acompanhei as interações no nosso instagram (segue aqui), e diversas vezes sobremesas afetivas foram compartilhadas. Sabe aquele doce especial que faz você se lembrar da infância, de momentos felizes e por ai vai? Quer saber qual é o meu? Lá vai: Bala de Canela.

‘Tai’ um doce que me faz menino de novo. Como eu adorava! Era uma bola enoooorme e vermelha que mal cabia na boca. E como ardia a filha da mãe! Lembro de comprar com um senhor num estacionamento ao lado do Banestado, banco que minha mãe tinha conta na época. E a bala Soft!? Que delícia! Que colorido lindo! Aquele doce que vinha cheio de avisos pra tomar cuidado para não morrer engasgado. Época boa!!!

Bala é muito bom. Seja pra tirar o bafo ou só pra dar aquela adoçada na boca, lá está ela…

Prática!

Acessível!

Docinha!

Viva a bala!!!

Nessa época de natal vejo muito um primo desse tipo de bala por ai, decorando tudo quanto é canto! Sabe bengalinha branca e vermelha? Nos filmes natalinos estadunidenses elas são colocadas dentro das meias, penduradas na lareira e colorindo a árvore de Natal. Por aqui só as de plástico mesmo, pra enfeitar. Uma pena…

Tanto a minha amada bala de canela, quanto o pirulito em formato de bengala, são balas duras. Para produzir necessitam de poucos ingredientes, muita paciência e destreza!!

É basicamente uma calda de açúcar que irá ser concentrada. Na verdade superconcentrada (já falamos disso…). Normalmente é adicionada glucose na jogada, pra evitar cristalização (não vou mentir que ajuda também na manipulação da bagaça por causa da viscosidade). Mas, o segredo está no ponto da calda.

Conforme esquentamos uma calda de açúcar dois efeitos acontecem simultaneamente com a água. O primeiro é a evaporação e, o segundo é o aumento da “capacidade” de solubilização do açúcar. A somatória desses efeitos faz que, com tempo e calor, o açúcar fique mais concentrado na calda. Quando resfriada, dependendo da concentração que você alcançou, é possível obter um produto com características físicas bem diferentes, que vão do liquido viscoso até um sólido vítreo. Esses são os ditos pontos de calda.

Fora a minha monumental preguiça nesse momento, não vejo o porquê fazer uma tabela com as informações de cada ponto. Vocês encontram com muita facilidade isso a um Google de distancia (também tenho que ensinar a pescar, né…). Mas, mesmo assim, vou dar uma dica: a maioria das tabelas em português se refere à calda SEM glucose, já a maioria das tabelas em inglês COM glucose, por isso há uma leve diferença nas temperaturas para um mesmo ponto de concentração.

Ah!

E eu DETESTO os nomes dos pontos, tanto em português quanto em inglês. Parece que foram feitos bem na preguiça, sabe? 

Mas deixa isso para lá, vamos ao nosso ponto.

Nosso ponto é o ponto de vidro, ou vidrado, ou de quebra firme (ou hard candy, ou hard crack se você tiver predileção pelo idioma de Biden). Aliás, esse ponto é o ponto de outras duas coisas muito legais: da cobertura da maçã do amor (muitas vezes sem glucose) e do vidro falso que a gente aprendeu no Mundo de Beakman.

Nesse ponto a concentração de açúcar chega a 99% e ocorre quando a temperatura está entre 146-155°C. É um ponto bem infeliz porque é um ponto antes do caramelo. Log, se não tiver um termômetro muito bom, próprio para açúcar, capaz de controlar tudo com exatidão, sua bala vai ficar marrom, perder a liga e fica uma porcaria! E já que dica é de graça vou dar outra: panela de cobre é uma boa opção pra fazer esse tipo de doce. Por quê? Vasculha o Sobremesah que você acha.

Está com preguiça né? Clica aqui vai! 

Enquanto a massa está quente ela é maleável e pode ser moldada ou cortada. Alias, é nessa fase, fora do fogo, que se adiciona o corante e a essência, homogeneizando tudo até obter aquela balinha linda, mara e transparente. Agora, se você quer arte, ai tem mais uma etapa: a de puxar.

Você já deve ter visto sua avó com um gancho na parede puxando, torcendo e dobrando bala de coco até chegar ao ponto desejado. Esse processo é para aerar a bala e dar opacidade (deixar opaco) e com uma sensação maior de desmanchar, derreter na boca (se lembra da bala de coco dos aniversários de outrora? Porque hoje em dia não se fazem mais balas como antigamente…).

As bengalinhas de natal passam pelo mesmo processo, são puxadas e depois trançadas!

FIM!

 

 

“Nossa Lucas que texto leve, sem claro e sem polemicas você fez!”

Não!

Não vai ter paz! Não vai ter fim!!!

Tem polemica simmmm.

…Infelizmente está no meu contrato:

O item 2 do paragrafo terceiro é claro:

O item 2 do paragrafo terceiro é claro: O item 2 do paragrafo terceiro é claro: O item 2 do paragrafo terceiro é claro:
  • 3.2 – O contratado deve obrigatoriamente criar e/ou solucionar polêmica para fins iniciar e/ou mitigar tretas no perfil do Instagram do contratante.”
  • Tanto eu como a Sra. Sobremesah temos isso no contrato. Não é a gente que quer confusão, somos extremamente pacíficos… É tudo culpa da Joyce! Vão tirar satisfação com ela, não com a gente!!!
  • A ideia deste texto surgiu também por discussões que vi no Instagram do Sobremesah. Tenho observado uma tendência cada vez maior de “demonizar”, digamos assim, a indústria de alimentos. Não que eu ache que ela não tem sua parcela de culpa, mas acho que há exageros em alguns pontos debatidos. E ai apareceu a bala! Por que não?

Balas e pirulitos são doces simples, de fácil acesso e encontrados em todo lugar. E tem mais: é um dos doces que mais damos acesso a crianças. O Halloween que passou, faz pouco tempo, está ai para não me deixar mentir.

Para dar os doces para as crianças da sua vizinhança você fez uma fornada de biscoitos, panelas de brigadeiros ou foi numa Marsil da vida e voltou cheio de doces?

E esse doce simples a confeitaria, doçaria, ou o nome que você prefira dar, simplesmente largou mão. Não há boas opções de pessoas fazendo balas e pirulitos, que alias é um processo lindíssimo, que na mão de bons artesãos o resultado é realmente impressionante! E não estou falando daquelas balas que ficam com desenhos complicadíssimos no miolo, que a gente acha no youtube. A beleza não está só na complexidade, o simples pode ser belíssimo!

Já pensou que bonito presentear no natal, época que a gente mais se rende as especiarias, um saquinho de balas de canelas caseiras? Fica ai a reflexão… E a oportunidade para 2021!

A Joyce perguntou uns dias atrás em suas redes um motivo de gratidão nesse ano turbulento. Não respondi no dia, mas vou aproveitar o espaço e responder agora! 

Sou muito grato ao convite que recebi para colaborar com o Sobremesah. Desde março me inseri nesse mundo da confeitaria e me apaixonei!! Tive que religar parte do cérebro adormecida para me lembrar da química de alimentos, também reacendi a paixão pela pesquisa, pela descoberta e pelo aprendizado!!

E fora tudo isso pude me aproximar mais ainda de uma pessoa que admiro muito e que tenho muito orgulho de dizer que sou amigo. Obrigado Joyce por me apresentar esse mundo novo. Sou grato a você por tudo isso.

E a você que está lendo espero que o que escrevi esse ano tenha o/a ajudado de alguma forma. Seja no aprendizado, seja na reflexão, seja na polemica… Espero vê-los ano que vem por aqui também!  

E a todos que não gostaram do que fiz, só posso desejar carvão debaixo da árvore de vocês. Simples assim! 

Grande abraço a todos e Boas Festas! (Festas no sentido de feriados. Sem baladas meu povo! Mantenham-se isolados pelo amor…)

 

 

fotos: Debby Hudson, Nagesh Badu | Unsplash

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